A uma semana bastante cansativa juntou-se um princípio da gripe na sexta, e por isso as bandas em palco tinham um desafio ambicioso: manter-me acordado até à 1, 2 das manhã.
A noite começou com o piano de Stuart Robertson. Música que não foi feita para deslumbrar, mas que nos embalou para um óptimo início de noite. O público foi sendo conquistado com as tentativas, bastante bem sucedidas, de falar português com a ajuda de uns pequenos papéis em cima do piano: Esta música chama-se Green Bay, e é do novo álbum, lia, com um sotaque surpreendentemente perto do perfeito.
Os Fink foram os senhores que se seguem, e tenho de confessar que foram os que pior cumpriram o desafio que lhes propus: culpa toda minha, claro, da semana cansativa e da gripe, nenhuma deles. Ainda assim deu para perceber que sai dali folk de qualidade, a ouvir com mais atenção num futuro próximo, isto vindo de alguém que, dizem-me, (mas claro que não acredito) era anteriormente um dj de música electrónica.
A fechar a noite, o pop surrealista de Adam Green, com um espectáculo que quem lá esteve não vai esquecer. Adam Green era o que eu melhor conhecia antes do Festival, e foi para mim o melhor das duas noites. Começa por ironizar com o português, e a meio das músicas vai sacando de um guia de convesação, abre uma página à sorte, e saem-lhe frases como "Não arranque o dente" ou "Estou gravída" (sic). Ele garante que "This is fun, it's the first time I do this", mas a ideia que fica é que o seu método de escrever canções não andará muito longe disto. Sentado timidamente, com os pés a apontar para dentro, ia-nos encantando com as suas músicas, cada uma mais catchy que a outra. Logo desde cedo avisou que I like to do drugs, I like to have drugs, e é realmente o que se percebe quando se vê alguém a rir-se das próprias músicas: ou se ri agora do que escreveu sob o efeito de substâncias ilegais; ou se ri exactamente por efeito das ditas substâncias; ou, provavelmente, por uma conjungação de ambas. É fácil perceber o complexo de Salieri olhando para este Mozart da pop: ali está um puto ganzado, que ninguém daria nada por ele, saindo-lhe as músicas com espantosa naturalidade, imagina-se que dispensando sequer ensaios, fazendo o que outros estudam, ensaiam, lêem, tentam, e não conseguem. É verdade que se engana, que pára e diz oh, fuck, que se esquece das letras, mas dá um sorriso e tudo lhe é perdoado, porque afinal o puto é mesmo bom. "I have so many songs, what should I play"? E o público sugere Jessica e ele canta, e Emily e Nat King Cole , e ele diz que sim a ambas mas depois esquece-ce da segunda, e Pay the toll que ele diz não saber a letra, mas trauteia e lá se lembra. E tivemos Bluebirds, e I Wanna Die, e Novotel, e Computer Show, e Gemstones, e Carolina, e What a waster dos Libertines ("I am gonna play this song because I play it very well"). E fomos para casa a assobiar, e felizes por ter saído de casa nesta noite de chuva.
Vinte e quatro horas de pulseira no braço depois a má notícia estava chapada na porta do teatro (que a mim, claro, me escapou): devido a uma gripe, Emiliana Torrini não estaria presente.
A noite começou com Ed Harcourt. O palco esperava-o já com os intrumentos para os Sparklehorse, e a primeira reacção ao vê-lo entrar sozinho de guitarra debaixo do braço é que podiam ter pensado numa solução melhor, porque o homem ficava quase escondido com tantos instrumentos. Nada de mais errado, já que metade dos instrumentos era mesmo para ele. Começa com a tal guitarra, é verdade, mas logo a larga, enquanto continuámos a ouvir aquilo que acabou de gravar. Vai mexendo numa caixita mágica com os pés, e grava também alguns sons com um pequeno metalofone, e quando canta, tocando guitarra eléctrica, é já sobre o som dos instrumentos entretanto gravados. Não sabia, não esperava, e adorei. Ao longo do concerto iria ainda sentar-se frequentemente ao piano ("I hate electrical pianos; sorry for not bringing a proper piano, and have to play in this toy") - com uma voz a fazer lembrar Damien Rice algumas vezes, enquanto outras grunhia à la Tom Waits -, e também gravar com a sua caixita mágica sons de bongo, de maracas e outros chocalhos, de pandeireta, de sei lá mais o quê. Não faço ideia qual a formação do senhor, mas desconfio que há ali pouco de garagem e muito de estudos a sério.
Sem Emiliana passamos directamente para os cabeças de cartaz da noite. Tenho apenas o It's a wonderful life, e pelo álbum pensei que ia gostar mais do concerto. Enquanto Ed Harcourt se cansou de pedir para colocar alguns instrumentos mais alto ou mais baixo, os Sparklehorse parece-me que optaram sempre pelo volume máximo, e isso acabou por abafar a voz de Mark Linkous, que nem merece nada ser abafada. O público gostou, parece, e exigiu os dois encores da praxe; se a memória não me falha no primeiro ouviu-se Gold day, no segundo It's a wonderful life.
Imagino que seja sempre difícil pensar em nomes para um festival que começou logo com Devendra + Robert Fischer + Sufjan Stevens. Este ano foi pena termos tido um nome a menos, mas de resto não desiludiu.
sexta-feira, dezembro 01, 2006
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